quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Doações de empresas a campanhas eleitorais deveriam ser proibidas?



Neste momento, um julgamento de extrema importância para o Brasil está sendo feito pelo Supremo Tribunal Federal. Está sendo julgada uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) feita pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que questiona a constitucionalidade das doações de empresas privadas (pessoas jurídicas) para campanhas eleitorais.

Hoje o financiamento de campanhas é uma mistura de financiamento público e privado. O financiamento público é feito através do Fundo partidário e do pagamento do horário eleitoral gratuito nas rádios e TVs. O financiamento privado é feito através de doações de pessoas jurídicas e pessoas físicas.

Até hoje, 19 de dezembro, 4 ministros já votaram pela inconstitucionalidade desse tipo de doação. Serão necessários mais 3 votos a favor para que isso seja decretado inconstitucional. Caso isso finalmente ocorra, não serão mais permitidas doações de pessoas jurídicas e o congresso terá que definir as novas regras para o financiamento de tais campanhas.


Campanhas eleitorais caríssimas

Hoje o principal caminho para se eleger para um cargo político no executivo ou legislativo é fazer uma boa campanha eleitoral. Em alguns casos, a campanha é mais importante do que toda a atuação política já feita pelo candidato.



É comum em muitas cidades aparecer um candidato a prefeito que quase ninguém conhece. Ele faz uma campanha eleitoral com uma fortuna gasta com ótimos marketeiros, para criar lindos panfletos, faixas, propagandas para a TV, rádio e internet, além daquelas "ótimas" musiquinhas de campanha.

Em pouco tempo, essa pessoa praticamente desconhecida torna-se amplamente conhecida, como se sempre tivesse feito parte do círculo político da cidade, e passa a ter grandes chances de vencer a eleição. Se o marketing for bom, sua vida antes da campanha acaba tendo pouca importância.

Obviamente uma campanha eleitoral desse nível custa uma fortuna. Para custear isso o candidato terá de fazer alianças políticas com muitos empresários, pois não há outro modo de obter tanto dinheiro. Os concorrentes desse candidato serão todos obrigados a fazer o mesmo ou terão pouquíssimas chances de se eleger.


Doações bastante interesseiras

O objetivo de uma empresa é a perseguição a todo momento do lucro. Ela age de acordo com as leis do mercado. Todas as suas ações são feitas pensando num retorno financeiro imediato ou futuro. Até mesmo quando faz uma doação a uma entidade beneficente, faz questão de divulgar isso amplamente para melhorar sua imagem diante dos seus consumidores, para estimulá-los a comprar mais produtos ou serviços dela.

Se uma empresa busca um retorno financeiro até mesmo com a doação para uma instituição que cuida de crianças com câncer, é de se esperar que alguma vantagem procure ao doar para uma campanha eleitoral. A diferença aqui é que nesse tipo de doação, as empresas geralmente não fazem questão alguma de divulgar que fizeram doações a vários candidatos.

Durante o período eleitoral, além da procura dos empresários feita pelos candidatos, também há a procura dos candidatos feita pelos empresários, para fazerem doações para suas campanhas, para que possam assegurar que no novo governo haverá políticos que os representem no poder executivo ou legislativo, caso vençam as eleições. Há casos em que uma empresa financia os dois principais concorrentes ao executivo, para garantir que terá sua influência no governo independente de quem vença a eleição.

Dessa forma, as empresas exercem uma enorme influência sobre os políticos eleitos, pois estes serão obrigados a colocarem as necessidades das empresas doadoras na frente das necessidades da população ou podem não conseguir mais doações para as próximas eleições.

Por outro lado, para se reelegerem, os políticos também precisam dos votos da população e precisam cuidar das necessidades dela. Mas mesmo com um mau governo esses votos podem ser conseguidos, através das ações de marketing, pagas com a fortuna doada pelas empresas. Assim, a maioria dos políticos eleitos opta por priorizar os interesses dos doadores. Já os interesses da população são levados em conta apenas quando não entrarem em conflito com os dos doadores ou quando uma revolta popular está ocorrendo.

Essa priorização dos interesses dos doadores de campanha não é um problema para os políticos que se elegem unicamente para manter o status, a renda e a roubalheira, mas é um problema muito sério para políticos honestos que realmente têm o interesse de brigar por melhorias para a população. Eles têm muitos projetos interessantes, mas precisam sempre conciliar os seus interesses com aqueles dos que o financiaram. Dessa forma, muitos dos projetos lançados na campanha eleitoral nunca saem do papel.


Caso o financiamento das campanhas por pessoas jurídicas venha realmente a ser proibido, o congresso nacional terá de regulamentar as novas regras para o financiamento das campanhas. Dentre as propostas atualmente em discussão estão: o financiamento exclusivamente público, o financiamento exclusivo através de pessoas físicas e o financiamento combinado dessas duas modalidades.

Financiamento público de campanhas

Com o financiamento exclusivamente público, as campanhas eleitorais seriam totalmente financiadas com o dinheiro dos nossos impostos. Isso poderia ser algo bom ou ruim, dependendo do volume de dinheiro que seria repassado aos partidos e de quais medidas seriam tomadas caso alguém recebesse doações por fora - o chamado "Caixa 2".

Para você ter uma ideia do quanto custaria o financiamento público de campanha eleitoral, em 2012, foram repassados aos partidos 286 milhões de reais do fundo partidário e foram gastos outros 600 milhões com o horário eleitoral "gratuito" na TV e no rádio. Ao todo, o Estado gastou R$ 892 milhões dos nossos impostos com os partidos políticos. Isso representa apenas uma fração dos 5 bilhões gastos em 2012 com as campanhas eleitorais.

Estadão - Em uma década, País pagou R$ 6,8 bi para fundo e propaganda de partidos

Quanto dos nossos impostos seriam disponibilizados para custear as campanhas eleitorais no caso da aprovação do financiamento exclusivamente público? Esse custo valeria a pena? Por outro lado, será que o custo da corrupção criada por essa relação de dívida do político para com a empresa doadora não traz um prejuízo muito maior?

Outra discussão a respeito do financiamento público é que a distribuição dos recursos e do tempo de TV depende da quantidade de deputados federais eleitos por cada partido. Em 2012, o PT com  89 deputados eleitos, recebeu do fundo partidário 43,2 milhões, o DEM com 26 deputados recebeu 18,2 milhões e o PSOL com 3 deputados recebeu 3,8 milhões.

Os que hoje são contra essa distribuição desigual de recursos argumentam que isso é feito apenas para continuar mantendo no poder os que já estão lá, dificultando ao máximo a entrada de novos partidos. Em resumo, os grandes recebem mais dinheiro para que nada mude e os pequenos, se quiserem chegar lá, terão de aprender também a arrecadar dinheiro das empresas.

Já os que são favoráveis a essa desigualdade argumentam que essa é uma medida para evitar que partidos existam unicamente para receber o fundo partidário e o tempo na TV, sem intenção realmente de vencer alguma eleição. Para essas pessoas, só teria direito aos recursos e tempo na TV se o partido eleger alguém, mostrando que tem alguma representação na sociedade. Hoje existe partido que não tem sequer um único vereador eleito em todo o país.


Financiamento através de pessoas físicas

Hoje, raríssimos candidatos têm suas campanhas financiadas exclusivamente por pessoas físicas. Na maioria dos casos, isso só é feito por alguns pequenos partidos de esquerda, que conseguem muito poucas doações e não chega a ter 1% dos recursos dos outros candidatos que receberam dinheiro de empresas. Hoje há uma desilusão tão grande com a política, que poucos têm a vontade de tirar dinheiro do bolso para ajudar na campanha de um candidato.

Um caso muito interessante foi o da campanha do deputado estadual Marcelo Freixo para a prefeitura do Rio de Janeiro, que conseguiu arrecadar através da internet 162 mil reais, quantia muito próxima da arrecadação de pessoas físicas para Dilma Roussef na eleição para presidente (170 mil). Esse valor corresponde a 15% dos R$ 1.039.561 declarados como arrecadados. Cerca de 200 mil (19%) foram arrecadados num show do Caetano Veloso e do Chico Buarque, feito especificamente para arrecadar fundos para a campanha dele. Outros R$ 626 mil (60%) foram arrecadados de 4 empresas. O concorrente dele, o Eduardo Paes, arrecadou R$ 21 milhões.

Mesmo com apenas 5% da arrecadação do Eduardo Paes, o Marcelo Freixo conseguiu 28% dos votos, algo impressionante, que só pode ser compreendido analisando sua campanha eleitoral, feita de forma totalmente inovadora, com milhares de voluntários e com uso intensivo das redes sociais. Até encontrei dois artigos acadêmicos onde são feitas análises da campanha dele.

Artigo 1: O twitter de marcelo freixo nas eleições de 2012

Artigo 2: Estratégias de campanha política online: análise do caso Marcelo Freixo

Site do TSE: consulta de receitas das campanhas eleitorais

Comício de Marcelo Freixo em 2012 com aproximadamente 10 mil pessoas


Qual seria a melhor opção?

Creio que a melhor opção seria a legalização de uma mistura entre o financiamento público e o financiamento privado somente através de pessoas físicas, com limites não muito altos de doação por cada pessoa. O financiamento exclusivamente público exigiria um investimento extremamente alto de dinheiro público nas campanhas. O financiamento exclusivo através de pessoas físicas iria gerar muito pouca arrecadação e inviabilizaria a campanha da maioria dos políticos de hoje. Apesar de eu achar isso positivo, o congresso jamais terá o interesse por essa opção.

O financiamento misto faria com que menos dinheiro público fosse gasto nas campanhas e os políticos seriam obrigados a fazer propostas de governo mais populares afim de atrair doações de pessoas físicas. No caso do não cumprimento das propostas de governo, seria difícil atrair mais doações desse tipo numa eleição futura.

Por outro lado, de nada vai adiantar proibir as doações de empresas, se não houver a perda de mandato para quem cometer o crime de caixa 2. Se continuar como está hoje, com penas de 3 a 8 anos, que não resultarão em prisão nem em perda do mandato, a maioria das campanhas eleitorais vão continuar recebendo doações de empresas, só que por debaixo dos panos. Fazer "Caixa 2" continuará sendo um benefício enorme com um risco extremamente baixo. 

2 comentários:

  1. A esperança é arma que nos move para continuarmos lutando.
    Anisia Nascimento


    http://educacaoinfantil-anisianascimento.blogspot.com.br

    ResponderExcluir
  2. Este comentário foi removido por um administrador do blog.

    ResponderExcluir