quinta-feira, 17 de abril de 2014

O depoimento de Nestor Cerveró e as trapalhadas da Dilma

Nestor Cerveró à esquerda, ex-diretor da área internacional da Petrobrás
Ontem, 16/04, houve uma sessão da Comissão de Fiscalização e Controle da câmara dos deputados, em que o ex-diretor da área internacional da Petrobrás Nestor Cerveró foi prestar esclarecimentos sobre a compra de uma refinaria de petróleo em Pasadena no Texas em 2006.

O caso se tornou um dos principais temas discutidos pela imprensa nos últimos 30 dias, após divulgarem de maneira massiva que a Petrobrás teria gasto mais de 1 bilhão para comprar uma refinaria que supostamente valeria apenas 42 milhões. Essa mensagem foi repetida à exaustão pela imprensa, por políticos da oposição e por muitos em postagens nas redes sociais.

Os números mencionados nessas matérias da imprensa estão repletos de informações incompletas, pois a intenção da imprensa não é de informar bem aos leitores e sim provocar um escândalo que prejudique a atual presidente e favoreça outro candidato à presidência de sua preferência.

No dia 19/03, a presidente Dilma Roussef, que em 2006 era a presidente do conselho de administração da Petrobrás, emitiu uma declaração dizendo que na época em que o conselho tomou a decisão, não constava no resumo executivo (que teria embasado a decisão do conselho) informações sobre duas cláusulas, chamadas Marlim e Put Option, que de acordo com a presidente seriam informações essenciais sobre o negócio. A presidente disse que se tivesse conhecido essas cláusulas na época, não teria votado pela compra da refinaria.

Segundo a presidente, quem deveria ter inserido essas informações no resumo executivo era Nestor Cerveró, o diretor da área internacional da Petrobrás na época.

A partir daí, uma enorme "batata quente" foi jogada nas mãos de Nestor Cerveró, pois ficou no ar uma enorme suspeita de fraude ou negligência, em que ele seria o grande responsável.

Essas suspeitas cresceram bastante ao longo das últimas semanas por duas razões: a primeira foi a Petrobras resolver, bem no meio da chuva de denúncias da imprensa, demitir Nestor Cerveró do cargo de diretor financeiro da BR Distribuidora, cargo que ele ocupava até o mês passado. A segunda foi o fato de Cerveró ter ficado quase 30 dias sem dar qualquer declaração sobre o assunto.


O depoimento de Nestor Cerveró na Câmara

No início da reunião ocorrida ontem na Câmara dos Deputados, Nestor Cerveró falou por um longo período, explicando todos os detalhes do negócio, defendendo a compra da refinaria na época, que representava um negócio muito lucrativo antes de 2008. Disse que não enganou a presidente, que as cláusulas Marlim e Put Option não eram essenciais para tomar uma decisão sobre o negócio, que a compra da refinaria teria sido planejada durante um ano e não 20 dias como a imprensa falava e que a refinaria de pasadena não teria sido comprada pela antiga dona, a Astra, por apenas U$ 42 milhões e sim U$ 360 milhões.



Após as declarações de Cerveró, os deputados se revezaram em fazer declarações e perguntas para que fossem respondidas por ele.

Vários deputados da oposição elogiaram o trabalho dele, disseram que ele parecia ser um ótimo funcionário da Petrobras, que estava sendo acusado injustamente de algo que ele não seria o responsável e que a cúpula do PT estaria colocando ele como "bode expiatório" nessa história. Ele iria ter sua carreira totalmente destruída para salvar o governo do PT, que logo o abandonaria.

O discurso dos deputados tinha claramente a estratégia de fazê-lo dar qualquer declaração que culpabilizasse alguém da cúpula do governo, principalmente a Dilma Roussef. Que ele entregasse a Dilma para não cair sozinho. Qualquer declaração contra o governo seria prontamente usada nos dias seguintes para ataques da imprensa contra o governo.

A todo momento diziam que as declarações da Dilma e a dele não combinavam (o que é verdade) e faziam perguntas como:

"Quem é que está falando a verdade, você ou a Dilma? Quem está mentindo?"

"Quem cometeu o erro? você ou ela? Você enganou a presidente?"

"Você disse aqui que a compra da refinaria foi um bom negócio, mas o governo diz que foi um mal negócio. A Dilma e a Graça Foster estão equivocadas?"

Mas Nestor Cerveró, que estava acompanhado de seu advogado, certamente se preparou bastante antes de se submeter a essa sessão e percebeu claramente essa intenção dos deputados da oposição. Por isso se esquivou de qualquer resposta do tipo "A Dilma mentiu", "a Dilma não leu tal documento" ou "a Dilma está enganada".


Sobre as divergências nas declarações

Creio que a raiz de todo esse barulho criado pela imprensa está na declaração de Dilma feita em 19/03, quando disse que se soubesse das cláusulas Marlim e Put Option, não teria comprado a refinaria de Pasadena. Hoje, após tudo que li sobre o caso, vejo que foi uma das maiores loucuras que se poderia ter publicado.

Refinaria comprada pela Petrobras em Pasadena no Texas
Primeiramente porque a cláusula Marlim, que garantia que a Astra, a sócia do negócio com a Petrobrás, teria direito a 6,9% de lucros independentemente das condições de mercado, jamais foi aplicada ao negócio, pois não ocorreu o investimento bilionário que a Petrobras faria no negócio, para mudar a refinaria processar óleo pesado, que ativaria a cláusula.

Em segundo, porque, pelo que já foi informado pelo ex-presidente da Petrobras Sérgio Gabrielli e por Nestor Cerveró, a cláusula Put Option é extremamente comum em quaisquer compras de empresas. É uma cláusula de saída do negócio, em que os sócios estabelecem em contrato como será feita a saída de algum deles do negócio. Como já foi demonstrado pela imprensa, o mesmo conselho de administração da época aprovou a compra uma refinaria em Okinawa no Japão que também continha a cláusula Put Option.

Quando a presidente emitiu uma nota dizendo que não teria comprado a refinaria de modo algum se soubesse dessas duas cláusulas, ela deu um grande tiro no pé, pois apenas essas cláusulas não seriam justificativas para deixar de comprar a refinaria. Quando começou a demitir alguns diretores da Petrobras por causa do barulho da imprensa, o governo passou mais declarações de culpa. A oposição vibrou. O governo fez uma besteira atrás da outra.

A declaração da presidente Dilma Roussef deveria ter sido igual às declarações de Nestor Cerveró e Sérgio Gabrielli, que me parecem muito mais realistas. Deveria ter dito que a decisão da compra na época em 2006 foi um bom negócio, que era um negócio muito lucrativo, que a refinaria estava dentro do preço médio de refinarias daquele porte (algo que já comprovei), que era falsa a informação de que Pasadena tinha sido comprada por apenas U$ 42 milhões.

Deveria ter explicado que o negócio se tornou ruim por causa da mudança nos rumos dos investimentos da Petrobras, que passou a se dedicar ao Pré-sal, deixando de fazer o investimento planejado em Pasadena e que a crise econômica internacional prejudicou muito o negócio. 

Dilma deveria ter assumido desde o início que a refinaria deu prejuízo mesmo, mas que era apenas mais um dentre os centenas de negócios nos quais a Petrobras estava envolvida. Deveria ter dito que os 530 milhões de prejuízo que Pasadena teve não eram nada em comparação com os mais de 200 bilhões de lucro líquido obtidos de 2006 até hoje. 

Enfim, a Dilma deveria ter partido para o ataque. Ficou somente na defensiva e foi completamente bombardeada sem dó nem piedade pela imprensa. E acho bem feito, para aprender a ser mais esperta.

Às vezes tenho a impressão de que tem alguém ao lado da Dilma aconselhando-a a tomar as piores decisões possíveis e imagináveis, para prejudicá-la. Isso me lembra alguns episódios do seriado americano House of Cards, em que o vice-presidente americano bajula o presidente com frequência e a todo momento dá maus conselhos, com a intenção de prejudicá-lo, para garantir seus interesses. Parece ficção, mas diante de tantas trapalhadas do governo, faz sentido pensar nessa possibilidade.

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Caso tenha gostado deste tema, seguem outros posts deste blog sobre o mesmo assunto:

Como calcular o prejuízo real da Petrobras na compra da refinaria de Pasadena? (24/03/2014)

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