Recentemente o ex-agente da NSA (Agência de Segurança Nacional norte-americana) Edward Snowden revelou que os EUA têm acesso a quase tudo o que fazemos na internet, desde nossos e-mails, nossos contatos nas redes sociais e até mesmo o que fizemos, quando fizemos e onde estávamos.
Revolução na comunicação
Hoje com as redes sociais, a capacidade de comunicação dos cidadãos atingiu um nível que há poucos anos era inimaginável. Algo que ocorre às 8:00 no interior de São Paulo pode já ser conhecido por milhares de pessoas por todo o país às 8:30, sem que a imprensa tenha feito a divulgação do fato. Isso passou a ser assustador para a imprensa tradicional, pois ela perdeu o monopólio da produção e divulgação de notícias. Ocultar acontecimentos da população tornou-se cada vez mais difícil.
A imprensa tradicional ainda possui muita força, mantendo uma influência política muito relevante. Mas agora eles não têm mais o poder de decidir sozinhos o que a população vai ficar sabendo ou deixar de saber. Chegamos a um ponto em que eles são obrigados a fazer reportagens sobre assuntos que não gostariam de comentar, pelo fato de estarem repercutindo bastante nas redes sociais. Essa perda de poder é um duro golpe para as elites que comandam os governos mundo a fora.
Censura após 11 de setembro
Lembremos do que aconteceu nos Estados Unidos após os ataques às torres gêmeas em 2001. Eles iniciaram uma guerra contra o Afeganistão, mas o verdadeiro alvo deles era o Iraque. A partir daí, o governo passou a divulgar uma sucessão de mentiras incessantemente através da imprensa. Começou a dizer que o líder terrorista Osama Bin Laden estava associado a Saden Hussein, que na época governava o Iraque. Passou a dizer que Sadam Hussein estava desenvolvendo armas químicas e nucleares, e em seguida passou a dizer que ele entregaria essas armas ao Bin Laden, para que ele realizasse ataques terroristas contra os EUA. Imagine como os americanos se sentiram amedrontados com isso.
O que é interessante nessa história é que a imprensa ajudou bastante o governo norte-americano a divulgar essas mentiras. A grande maioria dos comentaristas que eram chamados para discutir o assunto eram favoráveis à guerra contra o Iraque. Cada vez mais foram sendo removidos da TV comentaristas contrários à guerra. Bastava que alguém se manifestasse contra a guerra, que a imprensa promovia um linchamento público, difamando essa pessoa diariamente.
O cineasta Michael Moore, após receber o Oscar de melhor documentário em março de 2003, poucos dias após o início da guerra do Iraque, fez um discurso criticando o presidente Bush por ter iniciado a guerra. A partir desse dia, sua vida se tornou um inferno, pois a imprensa passou a atacá-lo incessantemente com todo tipo de críticas, para evitar que outros seguissem seu exemplo. Chegou ao ponto de pessoas na rua correrem para cima dele para agredí-lo. A coisa chegou a um ponto em que apresentadores de TV, como Glenn Beck, comentavam sobre a vontade que tinham de assasiná-lo. Ele chegou a andar com 8 seguranças para se proteger.
Esse tipo de coisa é o que pode acontecer quando a imprensa possui o monopólio da produção e divulgação de notícias. Em acordo com o governo, os veículos de maior audiência podem decidir contar apenas uma versão de um acontecimento e repetí-la incessantemente, para que todos acreditem que essa versão representa a verdade. Mesmo que alguns veículos menores digam o contrário, terão pouquíssima influência. É muito fácil manipular a população dessa forma.
A reintegração de posse do Pinheirinho
Casos como o da reintegração de posse do Pinheirinho em São José dos Campos, que desabrigou aproximadamente 6000 pessoas que moravam há quase 8 anos no terreno, em janeiro de 2012, foram praticamente ignorados pela televisão. O programa Fantástico exibiu uma reportagem de 2 minutos sobre o assunto no dia da desocupação. Já nas redes sociais, a repercussão foi enorme. Centenas de fotos e vídeos sobre o assunto chegaram às pessoas através do facebook e twitter, furando o bloqueio da imprensa. Essa repercussão gerou até matérias na imprensa estrangeira: BBC, The Guardian, Aljazeera.
Tentativas de controle da internet
Com a perda do monopólio da comunicação, os governos começaram a procurar maneiras de controlar a internet. Já que não valia a pena censurar o que era publicado nas redes sociais, resolveram buscar formas de espionar tudo o que todos estão fazendo na internet.
Ao saber por exemplo, que algum ativista anti-guerra, compartilhou com amigos uma música protegida por direitos autorais, o governo americano poderia exigir a prisão dessa pessoa. Há milhares de pessoas nos EUA sendo processadas por baixar esse tipo de conteúdo.
Ao descobrir que um jornalista está preparando uma matéria bombástica que irá destruir a imagem de uma empresa doadora de campanha de algum governo, seria possível agir rapidamente para impedir que a matéria fosse concluída ou distribuída para o público, através de suborno, intimidação ou até assassinato.
O pior de tudo é que essa vigilância não é feita apenas na internet, não é feita apenas pelo governo americano e o custo para fazê-la está cada vez mais barato. Já existem até empresas privadas como a VASTech da África do Sul que vendem sistemas que permitem a interceptação e o armazenamento de todas as ligações telefônicas do país pelo custo de apenas 10 milhões ao ano.
A empresa francesa Amesys vendeu ao governo do ex-ditador da Líbia, Muamar Kadhafi, o sistema "Eagle" que é descrito no documento comercial como "mecanismo de interceptação de âmbito nacional". Após a queda do ditador, essas mesmas instalações de espionagem voltaram a operar normalmente.
No livro "Cypherpunks: liberdade e o futuro da internet" Julian Assange comenta a que dimensão chegaram a interceptação e a análise das informações interceptadas:
Na verdade, a maioria dos países já chegou lá em termos de interceptação. O próximo grande salto será a eficiência da interpretação e da resposta ao que já está sendo interceptado e armazenado. [...] A Siemens está vendendo uma plataforma para agências de inteligência capaz de produzir ações automatizadas. Então, quando o alvo A estiver a determinada distância do alvo B de acordo com seus registros de interceptação por celular, e o alvo A receber um e-mail mencionando alguma coisa - uma palavra chave - a ação pode ser iniciada. Estamos muito perto disso. (Página 58)
Diante dessa realidade, a internet assume duas formas distintas. Por um lado permite uma liberdade de comunicação muito maior, aumentando o poder político dos que têm pouco dinheiro. Por outro lado, tornou-se uma enorme máquina de vigilância, que vigia cada passo que damos no mundo digital. Isso leva a muitas discussões sobre até que ponto a internet é útil na luta política e até que ponto ela se torna uma ameaça.
Não tenho dúvidas de que ficar fora das redes sociais não é uma boa opção. Sair delas significa perder muita influência. Mas ao mesmo tempo, manter-se nelas é estar alimentando as agências de espionagem, incluindo a nossa brasileira ABIN. Se futuramente houver perseguição de opositores do governo, como ocorreu no período da ditadura militar, aí sim o melhor é evitar ao máximo as redes sociais. Tudo dependerá do nível de liberdade de expressão que cada governo vai admitir. Cabe a nós lutar para que a internet seja um ambiente livre onde possamos nos organizar para fazer um contraponto à mídia tradicional e nos organizar politicamente para enfrentar tantas injustiças que nos cercam.
Muitíssimo útil as informações postadas, apenas não gostei desta citação: A empresa francesa Amesys vendeu ao governo do ex-ditador da Líbia, Muamar Kadhafi, o sistema "Eagle" que é descrito no documento comercial como "mecanismo de interceptação de âmbito nacional". Após a queda do ditador, essas mesmas instalações de espionagem voltaram a operar normalmente.
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